Alexandra Vieira de Almeida,
escritora e doutora em Literatura Comparada (UERJ)
Um livro destinado às crianças jamais
deve demonstrar fraqueza, falta de poeticidade e riqueza literárias.
Infelizmente, observamos um filão de livros infanto-juvenis que não impulsionam
o caráter lúdico das crianças e jovens.
A literatura para os pequenos acabou
seguindo os mesmos padrões da literatura adulta, ou seja, a lei do mercado, da
literatura fácil, cheia de obviedades. A literatura tem de problematizar, levar
a reflexões e isto deve surgir desde a infância. Os pequenos têm de desenvolver
suas potencialidades imaginativas sendo aceleradas à medida que eles crescem.
Quando jovens, encontramos a fase de
transição para a vida adulta e à literatura cabe o papel de transformação, de
indagação face aos problemas do mundo. Deve revelar a beleza, a magia, mas
também as doses de ironia juntamente com a leveza do poético. Porque a poesia
não está só nos versos, também está na prosa. Ambos se misturam. Esta é uma
visão tradicionalista, ver o texto somente por uma face. E a outra, a do
enigma?
Podemos nos reportar ao texto
“Pausa”, de Mário Quintana em que este revela que o escritor tem de lançar
desafios ao leitor, provocar enigmas. E o que temos? Uma enxurrada de clichês e
lugares comuns que não satisfazem a potencialidade do literário, este sim
criador das imagens vibrantes, ricas e impactantes.
Aprendi com um professor de filosofia
que para o texto literário demonstrar sua riqueza deve revelar imagens
inusitadas e não esperadas, sugerir e não esclarecer. Após suas palavras, mudei
o jeito de escrever não seguindo as linhas mais básicas da vida como vestir uma
simples camiseta. Preferi optar por costurar os véus da admiração filosófica, o
espanto e a surpresa de que tantos filósofos falaram, o “thauma” dos
pensadores.
Do simples, do corriqueiro, do
cotidiano, o escritor pode construir o sublime, o grandioso, o monstruoso, que
é a própria força do literário unido ao dom de “enigmar”, pois a literatura não
pode estar separada da filosofia, sua prima em indagações.
É preciso construir uma geração de
pequenos questionadores. Cabe ao escritor tirar do mais simples o original,
novo e enigmático. Portanto, a literatura infanto-juvenil tem de tirar esta
fraqueza dos pequenos, seus mimos, seus doces facilitadores e incutir neles a
força da inventividade poética para saírem de sua fase de sonolência para o
acordar das questões e das criações, sendo eles mesmos uns inventores de mundos
possíveis e impossíveis.
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